Os segredos de ‘Chico’, de Luísa Sonza: o pagode que virou bossa com autor de ‘Camaro Amarelo’

“Chico”, a bossa nova mais comentada do século, quase foi lançada como um pagode. Não fosse Bruno Caliman, um dos cinco compositores e autor da melodia, a canção de Luísa Sonza em homenagem ao influenciador Chico Moedas certamente não teria gerado tanto debate.

A faixa, incluída no novo disco da cantora, “Escândalo Íntimo”, foi a mais ouvida do Brasil no Spotify nas últimas semanas. E há quem comemore uma bossa nova ter chegado ao topo desse ranking pela primeira vez, 65 anos depois do compacto de João Gilberto (1931-2019) com “Chega de Saudade”, considerado o trabalho inaugural do gênero que mudou tudo na música.

Mas há quem negue o rótulo para a canção, argumentando que “Chico” é simples demais para uma bossa. “Tudo que é muito purista leva ao preconceito”, rebate Caliman, em entrevista ao g1 (veja os principais trechos no vídeo do topo).

“Eu acho que os grandes compositores da bossa nova estão amando ver isso acontecer.”
Baiano, como João Gilberto, e vivendo no Espírito Santo, terra de Roberto Menescal, Caliman viajou a Los Angeles (EUA) a pedido de Luísa para ajudar a compor músicas do novo álbum — além de “Chico”, ele participa de “Não sou demais”, “Iguaria” e “Carnificina”.

O maior sucesso do “Escândalo” nasceu para reproduzir em música a energia e a personalidade de Chico Moedas. O namorado de Luísa ficou famoso como um bon vivant dos novos tempos, passeando por botecos do Rio de Janeiro e comentando assuntos variados com os amigos em lives na internet. Tudo bancado pelo suposto êxito no investimento em criptomoedas.

A faixa ficou pronta em cerca de 40 minutos, com Caliman discutindo letra e melodia com as demais compositoras: a própria Luísa, Carolzinha e Jenni Mosello. O produtor Douglas Moda é o quinto nome dos créditos.

“O disco inteiro foi feito em cima de beats, batidas prontas. Esse é o jeito do pop compor. Essa música tinha um beat pronto no computador, que lembrava um pouco de pagode”, ele conta. “Era muito rápido para falar de amor.”

Foi Caliman quem deu a ideia de criar a harmonia no violão, com acordes mais próximos da bossa nova.

Praticando obsessivamente em um banheiro da casa da irmã em Diamantina (MG), em 1955, João Gilberto criou a batida mítica da bossa nova com seu jeito revolucionário de tocar violão, inspirado no batuque do tamborim.

Para iniciantes no instrumento, é quase impossível reproduzir as melodias que surgiram a partir dali. Alguns clássicos da bossa nova — caso de “Minha Namorada”, de Vinicius de Moraes e Carlos Lyra, por exemplo — chegam a ter mais de 30 acordes. Para título de comparação, uma música sertaneja costuma ter entre três e quatro acordes.

“Chico” tem seis acordes. “Poucos acordes para uma bossa nova típica, mas há também músicas do movimento que são assim. Não tem uma regra estabelecida, depende muito de como a música é produzida”, ensina Caliman.

Ele compara o ambiente de criação da música, com amigos reunidos num quarto em Los Angeles, com o cenário onde foi plantado o embrião da bossa nova: as lendárias reuniões no apartamento de Nara Leão, no Rio, que juntavam nomes como Menescal, Lyra, Sérgio Ricardo, João Gilberto, Luiz Carlos Vinhas e Ronaldo Bôscoli.

“Eram quatro jovens tentando replicar a casa de Nara Leão. E o que eu mais quero é que várias casas se transformem na casa de Nara. A música brasileira precisa disso.”

Compartihe:

Facebook
Twitter
LinkedIn
WhatsApp
E-MAIL

Veja também: